Biodiversidade & Ecossistemas Urbanorurais: Paradoxo Societal
- João Leitão
- 4 de dez. de 2020
- 3 min de leitura
Atualizado: 20 de dez. de 2020

A palavra biodiversidade é formada pela união entre o radical grego bio (que significa Vida) e a palavra diversidade (que significa variedade). A biodiversidade tem por fonte a grande variedade de formas de Vida (animais e vegetais) que se podem encontrar em diversos ambientes, incluindo plantas, animais e micro-organismos, que povoam os diferentes espaços, desde o fundo dos oceanos, evoluindo pelas planícies, rios e albufeiras, e avançando em direção aos picos das serras, cadeias e cordilheiras montanhosas. A realidade biológica é caracterizada por uma enorme diversidade de espécies compreendidas como indivíduos semelhantes com capacidade para se reproduzir entre si e naturalmente, em respeito pleno dos valores ancestrais do equilíbrio sustentável e da Vida.
A biodiversidade comporta, simultaneamente, uma dupla responsabilidade, ou seja, a de capacitar e a de manter o equilíbrio das espécies em todas as unidades e dimensões espaciais. A ligação umbilical que existe entre os seres vivos e o ambiente deve resultar, portanto, na coexistência de diferentes camadas de sistemas muito complexos: os ecossistemas.
Os ecossistemas urbanos são um tipo especial de ecossistema, não apenas por via do espaço e identidade que ocupam e densificam, mas, sobretudo, pela necessidade, colocada a nu pela presente crise pandémica, de diversificar, em modos planeados, as espécies, os atores, os aglomerados e, sobretudo, as redes, os nós de rede e as interações nas pluralidades de espaço(s). No que toca aos espaços urbanos, estes devem ser (re)construídos, não substituindo cimento velho por cimento novo, mas sim através da (re)edificação responsável de baluartes espaciais da biodiversidade, no sentido de assegurar a (re)implantação de espécies vegetais e animais em contexto misto e diversificado, isto é, em ecossistemas urbanorurais. É, assim, que poderemos intensificar a luta contra as ameaças sem rosto, que ganharam importância e impacto, por força do acumular das faltas de respeito dos seres humanos em relação à Mãe Natureza, afastando-a do coração dos ecossistemas urbanos, que hoje devem ser muito mais, do que meros aglomerados urbanos concêntricos, com caixotes e servidores estandardizados de seres humanos info(in)cluídos, que vivem para não morrerem, desprovidos das defesas próprias da biodiversidade e dos valores do respeito pela Vida dos ecossistemas evolutivos.
As pessoas interessadas no tema desta crónica de opinião, podem, agora, ousar pensar: Mais (i)uma mensagem verde!?; mas não é apenas esse cunho opinativo que se quer aqui sublinhar, dado se tratar de um alerta amadurecido para o facto de, apesar de soar a paradoxo aparente, serem aqui aduzidos argumentos válidos para que as novas gerações de políticas públicas venham a conter capítulos verdes e sustentáveis, dedicados à biodiversidade urbanorural, aos ecossistemas urbanorurais, à fiscalidade verde, à saúde pública e à qualidade de Vida intergeracional. Esses capítulos também poderiam ser redigidos a partir dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), preconizados pelas Nações Unidas, mas não é exatamente o caso, pois é urgente desenhar e implementar, com flexibilidade, soluções locais, também válidas para problemas globais já diagnosticados, não obstante terem conhecido um perigoso agravamento, fruto de uma cegueira e irresponsabilidade coletivas, na via de um abismo anunciado.
Os caminhos trilhados nos ecossistemas urbanos trouxeram-nos, até agora, ondas pandémicas, incertezas na Vida e nos mercados, maiores desigualdades sociais, egoísmos extremos, desequilíbrios estruturais na saúde, na educação e no apoio social, deficit crónico das contas públicas e privadas, falta de investimento, problemas crónicos de produtividade, bem como o desligamento, por tempo indeterminado, dos elevadores sociais, com consequências indesejáveis ao nível do desemprego de longa duração, da gentrificação, do assédio moral e social, e da exclusão social das pessoas mais fragilizáveis e desprotegidas.
As vias para um futuro sustentável merecem ser escritas e prosseguidas com esperança, solidariedade, fraternidade e inovação social. Iniciativas como a Economia de Francisco, podem ser mobilizadoras das gerações mais jovens e menos jovens, para uma sociedade mais justa, menos egoísta, equilibrada e, sobretudo, livre, igual e com uma longa Vida sustentável.
No essencial, todos(as) somos diferentes, mas deveríamos ser tratados como semelhantes, experienciando a Vida num trilho justo e não discriminatório, não isento de desequilíbrios, contribuindo para um derrubar silencioso das barreiras e dos tetos sociais impostos, mais ou menos visíveis, na falta de diversidade dos ecossistemas. Isto porque, apesar de tudo o que se escreveu aqui, como referência a um paradoxo societal que nos assola e absorve, valeria a pena refletirmos, em conjunto, sobre os diferentes modos como (co)existimos nestes complexos ecossistemas, sobretudo, no estado de evolução em que os vamos deixar aos atores que se seguem no palco da Vida. Feliz e Santo Natal, na fronteira paradoxal, entre o que se faz e o que teria de ser feito, respeitando e valorizando a bio, ou seja, a Vida!
Publicado a 17/12/2020 no Semanário: Jornal do Fundão
João Leitão
Universidade da Beira Interior, NECE
CEG-IST & Instituto de Ciências Sociais, Universidade de Lisboa
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